Porque ele ganhou?

Antes de ser eleito, era pouco mais do que um ex-militar bizarro de baixo escalão, que poucas pessoas levavam a sério. Ele era conhecido principalmente por seus discursos contra minorias, políticos de esquerda, pacifistas, feministas, gays, elites progressistas, imigrantes, a mídia e as Nações Unidas. Porém, a maior parte dos eleitores votaram no partido dele, a nova força política dominante no país. Em janeiro do ano seguinte, ele tornou-se chefe de governo. Por que tantos eleitores instruídos votaram em um patético bufão que levou o país ao abismo?

Motivo 1


Os eleitores tinham perdido a fé no sistema político vigente. A jovem democracia não trouxera os benefícios que muitos esperavam. Muitos sentiam raiva das elites tradicionais, cujas políticas tinham causado a pior crise econômica na história do país. Buscava-se um novo rosto. Um anti-político promoveria mudanças de verdade. Muitos dos eleitores dele ficaram incomodados com seu radicalismo, mas os partidos estabelecidos não pareciam oferecer boas alternativas.

Motivo 2


Ele sabia como usar a mídia para seus propósitos. Contrastando o discurso burocrático da maioria dos outros políticos, usava um linguajar simples, espalhava fake news, e os jornais adoravam sugerir que muito do que ele dizia era absurdo. Era politicamente incorreto de propósito, o que o tornava mais autêntico aos olhos dos eleitores. Cada discurso era um espetáculo. Diferentemente dos outros políticos, ele foi recebido com aplausos de pé onde quer que fosse, empolgando as multidões.

Motivo 3


Muitos eleitores sentiram que seu país sofria com uma crise moral, e ele prometeu uma restauração. Pessoas religiosas, sobretudo, ficaram horrorizadas com a arte moderna e os costumes culturais progressistas que surgiam, onde as mulheres se tornavam cada vez mais independentes, e a comunidade LGBT começava a ganhar visibilidade. Os conservadores sonhavam com restabelecer a antiga ordem.

Motivo 4


Apesar dele fazer declarações ultrajantes, muitos pensavam que ele só queria chocar as pessoas. Muitos eleitores que pensavam diferente votaram nele, confiantes de que nem ele levava o que dizia a sério. Simplista, inexperiente e muitas vezes tão esdrúxulo, que até mesmo seus concorrentes riam dele, ele poderia ser controlado por conselheiros mais experientes, ou ele logo deixaria a política. Afinal, ele precisava de partidos tradicionais para governar.

Motivo 5


Ele ofereceu soluções simplistas que, à primeira vista, faziam sentido para todos. O problema do crime, argumentava, poderia ser resolvido aplicando a pena de morte com mais frequência e aumentando as sentenças de prisão. Problemas econômicos, segundo ele, eram causados por atores externos e conspiradores comunistas. Os eleitores "de bem" não deviam se culpar por nada. Tudo foi embalado em slogans fáceis de lembrar.

Motivo 6


As elites logo aderiram porque ele prometeu um atraente regime que beneficiava grupos de interesses especiais. Beneficiados, os industriais optaram por ignorar as tendências fascistas dele.

Motivo 7


Mesmo antes da eleição, falar contra ele tornou-se cada vez mais perigoso. Jovens agressivos, que o apoiavam, ameaçavam os oponentes, limitando-se inicialmente ao abuso verbal, mas logo passando para a violência física. Muitos eleitores que não o apoiavam preferiam ficar calados para evitar problemas.


Quem é ele?


De quem vocês acham que esse texto fala? Imaginou que se tratava de Bolsonaro? Pois é. A semelhança é assustadora. Mas o texto fala de Hitler.

Eu apenas peguei o texto desta matéria no site El País e retirei as partes que mencionavam Hittler.

Leia aqui neste link a matéria original:
https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/06/opinion/1538852257_174248.html

Mas quero continuar o texto original daqui pra frente sem alterações... caso você não queira ir lá agora conferir.

E depois?


Doze anos depois, com seis milhões de judeus exterminados e mais de 50 milhões de pessoas mortas na Segunda Guerra Mundial, muitos alemães que votaram em Hitler disseram a si mesmos que não tinham ideia de que ele traria tanta miséria ao mundo. “Se soubesse que ele mataria pessoas ou invadiria outros países, eu nunca teria votado nele ”, contou-me um amigo da minha família. “Mas como você pode dizer isso, considerando que Hitler falou publicamente de enforcar criminosos judeus durante a campanha?”, perguntei. “Eu achava que ele era pouco mais que um palhaço, um trapaceiro”, minha avó, cujo irmão morreu na guerra, responderia.

De fato, uma análise mais objetiva mostra que, justamente quando era mais necessário defender a democracia, os alemães caíram na tentação fácil de um demagogo patético que fornecia uma falsa sensação de segurança e muito poucas propostas concretas de como lidar com os problemas da Alemanha em 1932. Diferentemente do que se ouve hoje em dia, Hitler não era um gênio. Não passava de um charlatão oportunista que identificou e explorou uma profunda insegurança na sociedade alemã.

Hitler não chegou ao poder porque todos os alemães eram nazistas ou anti-semitas, mas porque muitas pessoas razoáveis fizeram vista grossa. O mal se estabeleceu na vida cotidiana porque as pessoas eram incapazes ou sem vontade de reconhecê-lo ou denunciá-lo, disseminando-se entre os alemães porque o povo estava disposto a minimizá-lo. Antes de muitos perceberem o que a maquinaria fascista do partido governista estava fazendo, ele já não podia mais ser contido.

Era tarde demais.

* Texto livremente adaptado da matéria "Por que votamos em Hitler?" original no site El País neste link.

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