Retorno Terrível I

Eram 15 horas e ontem estavamos em Serra Grande e voltando pra Jequié. Tudo bem, tudo lindo, tempo bom e partimos. Perto de Ilhéus começou uma chuva fina que foi aumentando e ficando cada vez mais forte. O clima quente e a chuva formam uma combinação que faz com que os vidros embassem tão rapidamente que 10 minutos depois mal conseguiamos ver a estrada.

Meu irmão tentava limpar o vidro enquanto eu me virava dirigindo quase que as cegas me guiando apenas pela lona vermelha de um bendito caminhão que estava na nossa frente. E seguindo este caminhão conseguimos chegar a Aurelino Leal, antes da ponte sobre o Rio de Contas, na BR 101. Lá, paramos num posto, reabastecemos e aguardamos um pouco até a chuva passar.

Pronto. Estiou. Caímos na estrada novamente só que em poucos instantes estava chuvendo outra vez com o agravante de já ter escurecido. E lá estávamos nós: eu, Tote (meu irmão), Iêda (minha namorada), Rute (esposa de Tote), Raquelzinha (filha de Tote, com apenas alguns meses de vida) e Giullia (minha filha de 3 anos).

Eram tantos caminhões com seus faróis fortes em nossa cara que não conseguimos encontrar a entrada para a BR 330 que nos levaria a Jequié e seguimos direto na BR 101 em direção a Feira de Santana/Salvador. Alguns quilômetros na frente percebemos que tinhamos passado - e muito - do entroncamento onde teriamos que entrar e nos preparamos para fazer o balão pra voltar. Mas era noite, a BR 101 estava cheia de caminhões, estava chuvendo e muito escuro - sem contar o fato de ter pedaços de peneus na pista que nos deram alguns sustos.

Resolvemos ir seguindo até encontrar um posto ou um local mais seguro pra fazer o balão até que finalmente encontramos: era uma entrada de fazenda com uma boa área pra fazer tranquilamente nosso balão e retornarmos para nossa pista. Quando retornamos para a pista sentimos logo que o peneu trazeiro direito estava furado. Como estavamos no meio da BR tivemos que pensar rápido e o que nos veio à mente foi voltar para a entrada da fazenda pra podermos trocar o peneu por lá fora da rodagem.

Tentei 2 vezes fazer o tal balão mas todos dentro do carro já estavam assustados. A Rute já estava chorando e o Tote nervoso. Não consegui. O carro morria. Troquei de lugar com Tote e ele conseguiu colocar o carro na porta da fazenda.

A chuva estava cada vez mais forte mas tivemos (eu e Tote) que sair para ver o que podia ser feito. Resolvemos parar de ré embaixo da cancela onde tinha um pequeno telhado e luz. Precisávamos de um local seco para tirar toda a nossa bagagem do carro e assim poder tirar o peneu estepe. E assim foi feito. Iêda ajudou. Conseguimos tirar o peneu sem molhar a bagagem.

Era a hora. A chuva fortíssima nas nossas costas e lá estavamos nós suspendendo o carro com o macaco pra tirar o peneu furado. O terreno era inclinado e - por estar molhado - afundava. Colocamos pedras em todas as rodas para calçar o carro. E começamos a subir o carro com todo mundo dentro mesmo. Era impossível tirar as crianças e as mulheres de lá por causa da chuva, que estava mais forte naquele momento.

Minha filha pulava dentro do carro quando sentimos que era praticamente certo que o macaco não iria aguentar. Tiramos o peneu furado e quando iamos colocar o estepe vimos que tinhamos que subir um pouco mais o carro porque o peneu cheio estava maior que o peneu vazio. E lá vomos nós. Subiamos com cuidado e bem devagar com medo do macaco virar. Mas inevitavelmente aconteceu. O carro se inclinou um pouco para frente virando o macaco e ficando em cima dele. A chuva estava ainda mais forte.

E agora o que fazer? Sem macaco, o carro já sem a roda. Resolvi dar uma ré com o carro sem roda para ver se desprendia o macaco. Dei a ré e o macaco cedeu mas continuava embaixo do carro. Chamei Iêda para tentar puxar o macaco enquanto eu e Tote levantavamos o carro "na unha" e conseguimos. Agora tinhamos o macaco de volta mas não havia como colocar ele embaixo do carro. O disco do freio traseiro direito estava enfiado na terra molhada. E o carro estava rente ao chão.

Aí bateu o desespero. Achei que não havia mais jeito. O negócio era entrar no carro e dormir pra tentar arrumar a situação no outro dia. Pelo menos não teríamos chuva e teríamos luz do dia. Mas sabíamos que era arriscado. Foi quando Iêda fez algo inesperado: bateu palmas e começou a gritar para ver se alguém na fazenda poderia nos ajudar. Eu, sinceramente, achava que ninguém iria nunca sair de lá naquela chuva para ajudar. Já deviam estar assustados com a nossa presença por lá numa hora daquelas.

Pra minha surpresa aparece o caseiro de guarda-chuva. Pedimos a ele madeira: toras pequenas, tábuas de várias espessuras. Minha teoria era ir levantando o carro com as mãos e colocando embaixo as madeiras. Sobrepondo de modo que chegaria um momento que o carro estaria alto o suficiente para colocarmos o macaco embaixo. E assim foi feito.

Levou mais uma hora. Finalmente conseguimos altura o suficiente com segurança para colocarmos o peneu. Finalizamos tudo. Arrumamos as bagagens no lugar. Agradecemos o caseiro a grande ajuda e caímos na estrada novamente. Tote dirigiu daí até Jequié porque eu estava exausto. Foi quando a chuva parou.

Chegamos num posto onde fizemos a força e checamos as rodas todas. Tudo pronto novamente voltamos toda a BR 101 até chegarmos ao entrocamenteo com a BR 330. Já não estavamos mais perdidos. Chegamos em casa por volta de meia-noite. Uma viagem que normalmente fazemos em 3 horas levamos 9. Estavamos todos mortos de cansaço mas eu e Tote estavamos especialmente moídos e molhados.

Eu aprendi muito nesta viagem. Muito!

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